é um homem
Auto-retrato
Men on small islands shouldn't avoid the pursuit of happiness - Don deLillo
20/01/24
David Bowie
é um homem
18/12/23
2023 a desaparecer
08/12/23
Incertezas
Tomamos por verdade o que nos dizem nos écrans, não sabendo de quem é essa verdade, se dos ventríloquos, se dos bonecos que aqueles manipulam. A verdade deixou ser autoritária, e uma autoridade, e passou a ser uma gota de água num oceano de incertezas e mentiras. Se Deus não morreu com Nietzsche, certamente está morrendo agora.
22/11/23
Roseta
Horto das coisas guardadas: encontrei uma chave para a compreensão de todas as línguas mortas.
11/10/23
Normalidade
Antes, os artistas malditos matavam-se de amor, ou de fome, ou de melancolia. Hoje em dia, passeiam-se nas grandes avenidas da sociedade e são tratados a pãezinhos de doença mental. Belos eram os tempos dos loucos, dos excêntricos e dos destravados, dos que renunciavam à cómoda doença da normalidade.
10/10/23
Reflexo
Está na tua frente a verdade, e não a reconheces. Em vez disso, olhas para o espelho onde te vês refletido, ali ao lado da verdade. Enquanto o teu reflexo te enganar, tudo está bem.
06/10/23
Pular
O homem que dava pulos ficou sem pernas e agora anda por aí, de muleta na mão, pedindo esmola.
04/10/23
Coisas
Uma coisa. Atrás de outra coisa. E outra coisa mesmo. Somatório de tijolos construindo uma casa que recusa a habitação.
14/02/23
Ajudar a morrer
Na frente da casa eu convido quem queira entrar
nesses corredores onde despeço
o tempo e acomodo os tentáculos do esquecimento.
Em breve, da tua vida restará apenas um diário
deixado sobre a arca de mogno escuro
que num Verão antigo transportaram para o sótão.
Nesse diário vivem rostos, e árvores, e amor,
mas as letras que desenham tais inutilidades
começam a sumir – na sombra do sótão, não existem já.
no teu coração as criaturas do espírito que te levava
pela mão, do caminho da escola à ladeira que circundava
o muro mais longínquo da casa. Louro bravo
dançava com as sombras da figueira carregada
de Setembro – o figo, escrito no papel,
tocava os lábios como um verso doce
que te adormecia à noite. Na coroa aberta
do figo dançavam a língua e as palavras que a cobriam.
Tempo de certeza. O voo misterioso da andorinha
tinha o seu regresso marcado – todos os anos
o ninho estava à espera. O ritmo das estações,
exato e pleno, adormecia-te quando o temor rondava.
E ajudo a morte, ajudo, fecho as janelas de casa
sabendo que nunca mais as vou abrir.
Agora o conjunto de folhas é uma ruína fria na luz apagada da manhã.